CHALAÇA a peça

“Os processos que ocorrem no Brasil se dão à margem da história, e se história significa ‘tornar consciente’, os processos em curso no Brasil se dão à margem da consciência inclusive, ainda, do próprio brasileiro.” - Vilém Flusser
16.6.06

ESTADÃO

Humor picaresco toma palco na CPI do Primeiro Império

Dirigida por Márcio Aurélio, Chalaça, a Peça, adaptação do romance de Torero, volta ao passado para entender o Brasil atual
Beth Néspoli

A CPI do Império. Essa é uma das associações sugeridas - seriedade e humor embutidos aí - pelo espetáculo Chalaça, a Peça, que estréia amanhã no Teatro do Sesc Santana, sob direção de Márcio Aurélio, com a companhia Commediens Tropicales. No palco, nove atores formados pela Unicamp dão continuidade à pesquisa iniciada com Galvez, Imperador do Acre, também dirigido por Márcio Aurélio.
Entre os aspectos dessa pesquisa estão a construção da cena a partir da literatura, e não de um texto dramático, e o desejo de pensar politicamente, no maior desse termo, a tentativa de entender as origens dessa construção cultural, econômica e social que poderíamos chamar a Nação brasileira. Desta vez, o ponto de partida foi a adaptação de O Chalaça, de José Roberto Torero, romance picaresco que tem como figura central Francisco Gomes Chalaça, braço direito de D. Pedro I. Mas o grupo acabou voltando às fontes históricas, entre elas, cinco biografias de D. Pedro I, destaque para a obra da cientista política Isabel Lustosa.
No palco, a trama de Torero foi eliminada, ficaram os personagens, desde um barbeiro, passando pela Marquesa de Santos, até a princesa Leopoldina. E ainda surgiram outros, como o pintor Debret e até Torero. Todos, cerca de 30, dão seus depoimentos sobre suas ações. O período abordado é o da vinda de D. João VI até o fim do Primeiro Império, mas basta a leitura do texto para que venham à mente inúmeras associações com os tempos que correm.
"Tudo é muito comezinho nesses depoimentos, pessoal, particular. Não há grandeza ou generosidade; as pessoas tidas como elegantes socialmente são grosseiras em suas ações", diz Márcio Aurélio. Ele criou um elemento cenográfico a um só tempo simples e muito expressivo: a conhecida dança das cadeiras. O fato de ocupar um lugar, ou deixá-lo, acaba sendo determinante no comportamento dos personagens e até na sua identidade. Há ainda câmeras apontadas sobre o depoente e monitores de TV reproduzindo essas imagens."
Como vem acontecendo nos últimos anos, há uma quantidade avassaladora de depoimentos no palco. É da distinção entre real e virtual que se pode criar alguma verdade. Fazer recortes, criar sentidos é responsabilidade do cidadão. Acho importante que um grupo de jovens esteja querendo falar de questões tão complexas e sérias." E na chave do humor.

(SERVIÇO)Serviço Chalaça - A Peça. 90 min. 14 anos. Sesc Santana (349 lug.). Av. Luiz Dumont Villares, 579, 6971-8700. Sáb., 21 h; dom.,19 h. R$ 10. Até 9/7