CHALAÇA a peça

“Os processos que ocorrem no Brasil se dão à margem da história, e se história significa ‘tornar consciente’, os processos em curso no Brasil se dão à margem da consciência inclusive, ainda, do próprio brasileiro.” - Vilém Flusser
28.7.06

Fotos da estréia e fotos do Manso

Rompo o silêncio deste blog matando saudades da temporada já encerrada.
Logo mais estaremos nos palcos novamente e quem quiser pode rever-nos, ou desvirginar-se da experiência de assisitir CHALAÇA a peça.

Enquanto isso, coloco a disposição um videozinho que traz um compilação de fotos do dia da estréia.



Vem junto umas fotos que nosso querido Marinheiro Manso (e esse é o real sobrenome de Fernando) tirou no último final de semana.


















Ficaram curiosos? Agora terão que esperar!

Abraços,
Xella

7.7.06

Crítica - Maria Lúcia

Raízes do Brasil

Em Chalaça, a história do País é mostrada sem nenhuma pompa

MARIA LÚCIA CANDEIAS*
São Paulo

Tomando por base o romance “O Chalaça” do jornalista e escritor José Roberto Torero e o livro “Dom Pedro I, Um Herói Sem Nenhum Caráter” da cientista social e política Isabel Lustosa, Carlos Canhameiro estréia como dramaturgo com o “Chalaça — A Peça”, em cartaz no Sesc Santana, até 9 de julho.

A adaptação retira da obra da Isabel os fatos oriundos dos bastidores da gestão de D. Pedro I no Brasil. Do premiado livro de Torero, por sua vez, é explorada a versão ficcional da vida do alcoviteiro e melhor amigo do imperador, cuja verdadeira história permanece nas sombras, como convém a uma iminência parda.

A presença de Chalaça liga as cenas que isoladas não dariam conta de um
texto sólido porque seriam episódios soltos. É o primeiro trabalho de dramaturgia de Canhameiro, e este começo parece auspicioso.

No palco, ao todo são nove atores e trinta e cinco personagens. Entre eles destacam-se
Fábio Basili e o próprio autor, Paula Mirhan e Débora Monteiro. Mas vale dizer que o
elenco agrada como um todo, transmitindo muito da animação do palco para o espectador.
Tudo acontece num cenário muito simples e muito adequado de Daniela Elias e de Gabriel
Braga. Eles também assinam os ótimos figurinos que são de uma nobreza estilizada, como de resto é todo o comportamento dos personagens durante a monarquia. E o espectador fica a imaginar se essa bagunça era característica da nobreza brasileira, pois D. Pedro I tornou-se imperador sem muito preparo, diante da necessidade de D. João VI assumir o trono em Portugal, e quanto dessa desordem perdura no Brasil de hoje. Algo a se pensar.

A direção de “Chalaça ” leva a assinatura de Márcio Aurélio, o que já é rótulo de qualidade,
não só na condução do elenco como na da cena. O público nem se dá conta que a produção é econômica. O ritmo, todo o tempo, é como o de uma festa, como se se tratasse de uma anedota. A peça tem o pique da Copa, mas sem a tensão dos jogos. É um teatro cuja face séria se dilui à primeira vista, mas não depois disso. Vale assistir.

*Doutora em Teatro pela
USP e professora da Unicamp

Entrevista

Entrevista com Marcio Aurelio

Diretor de Chalaça - A Peça fala sobre a montagem, que satiriza¿importantes momentos da história brasileira

Cristian Cancino

Mais de trinta personagens que de alguma forma se relacionaram com Francisco Gomes da Silva, o Chalaça, alcoviteiro e secretário de Dom Pedro I, ocupam o palco do Sesc Santana sob a direção do experiente Marcio Aurelio. Chalaça - A Peça é uma adaptação da "biografia ficcional" O Chalaça, de José Roberto Torero, que se transformou em best seller e conquistou o prêmio Jabuti em 1995. Uma consulta ao dicionário pode dar pistas sobre um possível perfil do personagem: chalaça [S.f. 1. Dito zombeteiro. 2. Gracejo de mau gosto, ou insolente; graçola, chocarrice. 3. Caçoada, troça, zombaria.]

Encenador de sucessos recentes como Agreste e Pólvora e Poesia, Aurelio e a Cia. Les Commediens Tropicales criaram uma atmosfera de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para que os personagens tornassem público os bastidores de um Império regido pela devassidão e corrupção. Com isso, procura relacionar fatos históricos, levados à cena por nove atores sob um registro de interpretação entre o escárnio e a tragédia, com momentos recentes da política nacional. Nesta entrevista, feita por e-mail, o diretor fala sobre o processo de construção do espetáculo.

Portal Veja São Paulo - Como surgiu a idéia de montar Chalaça?
Marcio Aurelio - A Cia. Les Commediens Tropicales foi contemplada com o Prêmio Estímulo Flávio Rangel, da Secretaria de Estado da Cultura, para fazer uma transcrição cênica, sob minha direção, do livro O Chalaça, de José Roberto Torero. A idéia é decorrente da pesquisa que a companhia realiza criando espetáculos a partir de material não dramático, que tenha um viés crítico com relação à história do Brasil. Isto dá continuidade ao espetáculo que realizamos anteriormente: Galvez Imperador do Acre.

Portal Veja São Paulo - Na peça, o Império é desnudado ao se mostrar a sucessão de sacanagens que ocorria em seus círculos íntimos. Que artimanhas de linguagem o espetáculo utiliza para reverter a idéia de heroísmo associada a esses personagens históricos?
Marcio Aurelio - A artimanha é a construção de uma espécie de arapuca histórica onde o espectador vai enquadrando e construindo uma outra história, mais crítica, e vendo as personagens sendo enredadas em suas próprias tramas pessoais. As questões de ordem moral e social ficam relegadas e reduzidas ao plano dos afetos.

Portal Veja São Paulo - Todo o tempo TVs no palco mostram os personagens que vão à cena dar "depoimentos". Isso pode ser entendido como uma crítica à espetacularização do poder?
Marcio Aurelio - Sim, uma crítica sobre a criação mítica da personagem virtual em detrimento da real. A espetacularização da história.

Portal Veja São Paulo - A "estrutura de CPI" proposta pela encenação funciona como alusão ao momento político atual?
Marcio Aurelio - A estrutura de CPI é um recurso dramatúrgico para provocar o pensar crítico sobre a realidade social.

Portal Veja São Paulo - Fala-se de corrupção, traição, devassidão no Império. O senhor é capaz de apontar alguma (uma única que seja) virtude em D. Pedro I?
Marcio Aurelio - A virtude que vejo é a de essa figura servir como eixo para repensarmos a própria história.

Portal Veja São Paulo - As interpretações alternam "apresentação" e "representação". Ou seja, os atores em momentos encarnam o personagem, mas depois se transformam em narradores ou apresentadores de sua própria história.
Marcio Aurelio - O teatro contemporâneo leva em consideração a desmistificação da teatralização e se opõe à espetacularização do cotidiano. Assim tenta-se dar o caráter heróico e mistificador como chalaça histórica, uma vulgarização do épico como recurso crítico do pensamento.

Portal Veja São Paulo - Como é trabalhar com atores universitários e não universitários?
Marcio Aurelio - Os atores têm suas formações dentro de diferentes enfoques nas universidades e cursos profissionalizantes. O importante é a possibilidade de realizar trabalhos coletivos que busquem a partir de um projeto ético e estético uma linguagem clara, visando a cena autônoma e forte.

Portal Veja São Paulo - Para terminar, gostaria que o senhor indicasse alguns espetáculos em cartaz na cidade que considera imperdíveis?
Marcio Aurelio - A oportunidade de ver duas encenações de Ricardo III é um privilégio. Os Sertões - A Luta, Parte 2, de José Celso Martinez Correa; A Memória das Coisas, de Luis Alberto de Abreu; Esperando Godot, de Gabriel Villela; e Peça de Elevador, da Cia Elevador de Teatro Panorâmico.

Vejinha

Outro lado da história

O grupo paulistano Les Commediens Tropicales transfere para o palco o mais instigante romance de José Roberto Torero. Chalaça – A Peça investiga a vida de Francisco Gomes da Silva, o fiel e debochado secretário de dom Pedro I. O personagem teria presenciado e até influenciado fatos como o grito do Ipiranga e a primeira Assembléia Constituinte. Diante de um microfone, nove atores se revezam em trinta personagens da época do Brasil Império. Seus hilários depoimentos temperam a história com dados reais e fictícios que não estão nos livros.
Chalaça – A Peça. Direção de Marcio Aurelio (90min). 14 anos. Estreou em 17/6/2006. Teatro do Sesc Santana (349 lugares).